sexta-feira, novembro 30, 2007

arrastão

A mudança de roupagem (e de morada) do Arrastão, guardada para este final de Novembro, é esteticamente muito semelhante à mudança de roupagem que o jornal Público decidiu fazer no início do ano. Passaram de uns tons predominantemente cinza para um registo mais colorido, com o aumento no tamanho das imagens (coisa que no Público significou não só tamanho mas também quantidade, o que, ecologicamente - e atendendo ao suporte papel -, talvez não tenha sido uma opção muito honrosa). E ambos têm hoje um maior número de suplementos.
Mas, curiosamente (e ao contrário do Público), esta mudança de imagem do Arrastão é agradável desde o primeiro momento. E tem a vantagem comparativa de, como até aqui, se deixar linkar.

quinta-feira, novembro 29, 2007

pré-natal

Das iluminações nas ruas ainda não há grande sinal, mas os ambrósios já está de volta ao pequeno ecran. Quem nunca mais apareceu foi aquele avô com o neto, a quem este último dizia: "Não, não... O coelhinho foi com o pai natal e o comboio no palhaço ao circo."

quarta-feira, novembro 28, 2007

portugal é dos pardais e outras aves que tais

Tendo em vista uma solução mais eficaz do que a apresentada por José Manuel Viegas, o CDS-PP deverá levar nos próximos dias à Assembleia da República uma proposta de lei que intima os maçaricos de bico direito a abandonar as áreas inundadas junto ao campo de Tiro de Alcochete, de modo a resolver o principal obstáculo ambiental à construção do novo aeroporto.
Caso a Lei venha ser aprovada, estes espécimes receberão no seu domicílio a respectiva notificação do SAEF (Serviço de Aves Estrangeiras e Fronteiras), que os obriga a deixar, imediata e definitivamente, o nosso país. Em caso de desobediência, e para além de virem a ser pronunciados como imigrantes ilegais, estão previstas no diploma do CDS-PP coimas duríssimas para os maçaricos de bico direito, que se somam à suspensão automática do subsídio de férias e do décimo terceiro mês (para maçaricos empregados), e do rendimento social de inserção e restantes prestações sociais (no caso de maçaricos desempregados ou inactivos).

terça-feira, novembro 27, 2007

a dúvida

E sonhar com os Gato Fedorento, dá sorte ou azar?

segunda-feira, novembro 26, 2007

por um prato de lentilhas

Desde Março de 2003, na sequência da ocupação do Iraque, morreram mais de 160.000 civis iraquianos; cerca de 3.800 militares dos EUA e 86 jornalistas (nos 20 anos da Guerra do Vietname perderam a vida 63 jornalistas). E soube-se, há poucas semanas, que uma onda de suícidios de veteranos de guerra, com idades entre os 20 e os 24 anos, varreu os Estados Unidos em 2005 (numa média de 17 por dia).
Ficámos esclarecidos, em 2003, do oportunista desprezo de Durão Barroso pelo Direito Internacional, pela diplomacia da paz, pelo multilateralismo e pela ética em política, ao dispor-se a preparar servilmente a Cimeira dos Açores, e ao não querer se não ver, convenientemente, a forjada teoria das "armas de destruição maciça". E se tínhamos dificuldade em acreditar que Barroso era capaz de sacrificar tudo por um simples prato de lentilhas (o seu lugar de presidente da Comissão Europeia), as recentes declarações ao DN não deixam muitas dúvidas sobre a ambição desmedida e despudorada do homem.
Mas vamos até admitir que, em 2003, Barroso resolveu acompanhar os senhores da guerra, jamais pensando que a situação no Iraque se poderia tornar num caos e que o cenário de matança viesse a revelar-se tão dantesco. Quatro anos volvidos é isso que impressiona na entrevista ao DN. É que hoje, quando ninguém pode dizer desconhecer a realidade e os números da tragédia, as palavras que Durão Barroso tem para se referir à decisão de invadir o Iraque são as de considerar que "Não temos que estar de forma nenhuma arrependidos da decisão que tomámos"; e que "Portugal não perdeu nada, também na Europa, com isso. Repare, depois das decisões que tomei, fui convidado a ser presidente da Comissão Europeia e tive o consenso de todos os países europeus".
A Barroso aplica-se bem a frase, que uma amiga minha costuma usar: "É capaz de matar o pai e a mãe só para ir ao baile do orfanato."

sábado, novembro 24, 2007

como num quadro de paula rego

Tinha tido um sonho estranho. Estava no banco de trás de um táxi, conduzido pelo José Falcão, do SOS Racismo.

quarta-feira, novembro 21, 2007

songs for the season

Keith Jarret, The Köln Concert (1975)
Pode ouvir-se (clicando na imagem) o tema "Part I", do qual Nanni Moretti utilizaria um excerto nesse belíssimo e singular momento de Caro Diario, em que percorre de vespa as inóspitas e mediterrânicas paisagens do centro sul de Itália, a caminho da praia, na cidade costeira de Ostia, onde terá sido assassinado Pasolini (no mesmo ano do Concerto de Colónia).

terça-feira, novembro 20, 2007

correio da manhã

"Irrelevâncias antigas, infelicidades de sempre, vidas miúdas, perdidas num mundo que cada vez menos se controla, de que cada vez menos se descola (...). O retrato do pântano do nosso lento empobrecimento a que nos condena o modelo social vigente, da desorganização atávica das nossas instituições, do salve-se quem puder, de uma mediania muito perto da pobreza e do atraso (...). Não se é feliz no país do Correio da Manhã, mas o país do Correio da Manhã é o nosso país."

(José Pacheco Pereira, no Público de sábado)

segunda-feira, novembro 19, 2007

o argueiro e a trave

"E por que reparas tu no argueiro que está no olho
do teu irmão, e não vês a trave que está no teu olho?
Ou como dirás a teu irmão: Deixa-me tirar
o argueiro do teu olho, estando uma trave no teu?
Hipócrita, tira primeiro a trave do teu olho, e então
cuidarás em tirar o argueiro do olho do teu irmão.
Mateus 7.1-5
"Se a comunidade eclesial portuguesa e a mentalidade dos seus membros precisam de se colocar ao ritmo do Vaticano II, não ficaria mal aos bispos lembrar ao Santo Padre e à Cúria Romana que, embora haja muitas igrejas locais que resistem à renovação, a fonte principal dessas oposições radica no próprio Vaticano. O grande "cisma", pai de muitas dificuldades na Igreja católica contemporânea, aconteceu sobretudo a partir da encíclica Humanae Vitae. A inteligência cristã da sexualidade ficou paralisada: quem concorda concorda; quem não concorda ou deixa a Igreja ou passa à categoria de não praticante. Um outro ponto, cada vez mais importante é o seguinte: não se quer discutir a necessidade que muitos sentem da celebração cristã do casamento dos divorciados. Convidá-los para a Eucaristia e proibi-los de comungar é como convidar alguém para jantar e proibi-lo de comer. (...) Outra questão é o estatuto dos ministérios ordenados. Ao não permitir a ordenação de homens casados nem de mulheres, o resultado é este: exalta-se cada vez mais a Eucaristia, mas há cada vez menos possibilidades de a celebrar. No seu discurso, o Papa, em vez de abrir o caminho, fugiu à questão da atribuição dos ministérios sacramentais com a nebulosa habitual de misturar os planos."

(Do artigo de Frei Bento Domingues, no Público de ontem).

domingo, novembro 18, 2007

still

(Control, de Anton Corbijn, 2007)
"Caminhar no mais rigoroso silêncio para longe de alguém que nos ama até à morte. Uma estrada longa e impossivelmente direita, ladeada por nada. Onde há apenas uma vaga ideia de aves, uma noção tímida de flores, uma esquecida sugestão de absoluta bonança. Caminhar aí no mais rigoroso silêncio em direcção oposta a tudo o que se quer e deseja, devagar, hipnoticamente devagar, com nada em frente, e nada ao lado, e tudo, mas tudo, atrás."
(Miguel Esteves Cardoso, Escrítica POP, 2003)

sexta-feira, novembro 16, 2007

zeitigeist

"A geração dos meus pais teve que lidar com a II Guerra Mundial, o que tem uma dimensão diferente. Penso que todas as gerações têm fantasmas com que lidar. A nossa manifestava-se em questões culturais, o que foi libertador. Nunca fui punk, mas o punk libertava realmente. Dava inspiração às pessoas para criar, para começar qualquer coisa. O Tony Wilson [um dos proprietários da Factory, editora dos Joy Division] tinha uma óptima citação acerca disso: "A atitude da geração punk era 'vai-te foder', a da pós-punk era 'estou fodido'". Eu pertencia ao lado 'estou fodido'. Como tal, tinha uma ligação emocional a todo esse movimento pós-punk e, especificamente, aos Joy Division. Ainda que não entendesse as letras, senti que eles capturavam o "zeitigeist". Não precisava de as perceber, sentia-se o peso daquilo que cantavam na voz de Ian Curtis, nos sons que acompanhavam a música, no imaginário do primeiro álbum, que envolvia uma grande dose de mistério."

(Da entrevista de Mário Lopes a Anton Corbijn, o realizador de Control, no Público de hoje)

quinta-feira, novembro 15, 2007

inclinação

Definir Steve Jansen como sendo apenas o irmão de David Sylvian não seria justo em nenhuma circunstância. E menos ainda depois de Slope, o seu último trabalho (onde de resto Sylvian participa). A influência de Jansen nos trabalhos de David Sylvian (como Blemish ou Dead Bees on a Cake), ou nos álbuns mais explicitamente conjuntos (como os projectos Rain Tree Crow ou Nine Horses), torna-se agora ainda mais nítida.
Slope é por momentos o agradável exercício do minimalismo desintencionado. E noutros uma interessante combinação de soluções electrónicas mais ou menos ásperas com a simplicidade das cordas de uma guitarra de plástico ou com os sons pontuados de um xilofone. Em Slope, Jansen cria atmosferas que se contraem e vagueiam como plasma, de outonos dourados e de invernos por vezes crus, entre a melodia simples de Sleepyard e a trajectória difusa de Grip, com que se inicia a "inclinação".

terça-feira, novembro 13, 2007

linha única

Do livro literalmente mais à mão (Passageiros em Trânsito, de José Eduardo Agualusa), na sua página 161, em busca do 5º parágrafo (e nos termos de uma corrente que circula na net, e perante a qual esta resposta é também outsider): "Não há fim."

segunda-feira, novembro 12, 2007

and he is not

Depois da não realização do concerto no CCB a 21 de Outubro, a página oficial confirma o que já se temia: "Cancelled shows will not ben reschedulled. We regret to announce that there are no plans to reschedule David's performances that were cancelled due to illness". Sem o cancelamento definitivo, é provável que tudo tivesse começado mais ou menos assim:

(imagem com ligação ao vídeo, do concerto de Bruxelas)

domingo, novembro 11, 2007

ironia trágica

sábado, novembro 10, 2007

o estado regulador

Tem razão Vital Moreira quando defende que o Estado, enquanto empregador, "tem todo o direito de definir as regras de selecção dos candidatos ao ensino público, sendo natural que utilize critérios exigentes, para escolher os melhores candidatos." Mas isto significa também que o Estado admite, implicitamente, a existência de estabelecimentos de ensino incapazes de formar candidatos à docência com as competências mínimas e esperadas (as provas aprovadas pelo novo regime de recrutamento de professores incidem no domínio da língua portuguesa e na capacidade de raciocínio lógico, para além da aferição dos conhecimentos científicos e tecnológicos específicos das diferentes áreas disciplinares).
Face à elementaridade da avaliação de competências que está em causa, o Estado empregador não deixa por isso de interpelar com esta medida o Estado regulador, sublinhando a necessidade de assegurar que os estabelecimentos de ensino superior, públicos ou privados, cumprem de modo adequado a função de que estão investidos.
E é bom lembrar que o decréscimo de qualidade na formação de docentes, que hoje justifica esta medida, resulta em larga medida da abertura indiscriminada de instituições de ensino superior, nos tempos áureos do cavaquismo, em que se entendeu que ao mercado haveria de caber a selecção natural dos licenciados, sendo clara e intencionalmente descurado o papel regulador do Estado ao nível da quantidade da oferta e da qualidade dos cursos de formação de professores.

quarta-feira, novembro 07, 2007

problemas de agenda

"O lider máximo do PCP, Jerónimo de Sousa, não quis falar sobre o que é ser comunista hoje. Adiou a resposta ao longo do mês de Outubro e acabou por alegar problemas de agenda." (Do Público de hoje).

terça-feira, novembro 06, 2007

cidades com estátuas (VIII)

Da exposição de contos infantis em figuras de bronze (Scheveningen)
(Para o Francisco e o Xavier)

segunda-feira, novembro 05, 2007

educação e igualdade de oportunidades (II)

Para além das questões que a proposta de instituição do "cheque-ensino" coloca, como as que se assinalam aqui, deve sublinhar-se uma das suas consequências mais profundas, assente na erosão de um princípio basilar do ensino público: a lógica de proximidade.
Com ele, é igualmente a ideia de "escola democrática" que sofre um retrocesso, na medida em que deixam de estar criadas condições que favorecem a frequência de um estabelecimento de ensino por parte de alunos com proveniência social distinta.
Instituído o "cheque-ensino", as escolas deixam de recrutar os alunos numa lógica de cobertura territorial, passando a fazê-lo de acordo com uma lógica de procura (tal como sucede já hoje na cooptação de estudantes pelas escolas e colégios privados, alheia a critérios de natureza territorial). É verdade que os alunos passam a dispor da capacidade de escolher a escola que desejam frequentar. Mas o problema é que essa capacidade de escolha não é igual para todos, essencialmente por duas razões.
Do lado da procura, alunos com maior facilidade em organizar a sua mobilidade casa-escola passam a poder escolher num leque muito mais amplo de escolas. Esta amplitude é significativa no caso extremo de alunos que dipõem de motorista particular, menor em função da capacidade de conciliação da escola com os horários dos pais (em regra mais rígidos no caso de trabalho por conta de outrem), e muito limitada no caso de alunos cujos meios de deslocação dependem da frequência e horários do transporte público.
Do lado da oferta, os estabelecimentos de ensino passam a escolher os alunos em função dos seus proveitos escolares, promovendo um recrutamento que garanta a obtenção de bons resultados pela escola (ambição hoje mais acentuada, graças à pressão que os rankings vieram instituir). Os estabelecimentos de ensino mais procurados seleccionam os melhores alunos e dão, desse modo, corpo a um sistema que legitima e reforça a segregação social, arrumando tendencialmente alunos-tipo por escolas-tipo. E as diferenças nos rankings, mesmo que continue a ser diária a luta de tantas escolas e de tantos profissionais da educação, tendem a acentuar-se (mesmo que se mantenham os métodos pedagógicos, os quadros de docência ou as formas de apoio desenvolvidas por cada escola). Face ao estreitamento da oferta para alunos com piores resultados, a escola mais próxima poderá deixar de lhes estar tão acessível como até aqui, implicando um esforço acrescido nas logísticas de deslocação e de conciliação de horários, com impactos inevitáveis ao nível da motivação e do aproveitamento escolar.
Mas a consequência mais grave consiste de facto na uniformização social das escolas, superior à que já hoje se verifica, diminuindo a possibilidade de encontro entre alunos de proveniência social distinta, crucial para a troca de experiências e aprendizagens, para a partilha de vidas e horizontes, num processo de claro empobrecimento social, que aliás é mútuo.
A liberdade de escolha que se esconde por detrás da proposta do "cheque-ensino", não é só a transposição da lógica dos condomínios fechados e dos guetos para o sistema educativo. É também uma fonte inesgotável de desconhecimento social. Um caminho promissor para uma sociedade mais egoísta, fechada, ignorante de si mesma e desigual, e onde claramente se reduz a margem para promover a igualdade de oportunidades e os mecanismos de ascensão social.

domingo, novembro 04, 2007

o tratado de lisboa

Adjectivamente referendado aqui, com o patrocínio da Celldorado ("toques relaxantes no teu telemóvel").

sábado, novembro 03, 2007

playground martyrs

you run to the gatesyou know you'll be lateit's for your own goodit's for your own goodyou're likely to makethe grandest mistakeyou suffer aloneand the skin and the bonelet's sharpen thosenew sets of arrowsfor the next generationof playground martyrsand joining againon intolerable shamecause everyone sharesthe sins of their fathersschool bell ringssingle find intrade you might have believeeven afterso bring out those thingsthe hammer the wingsfor the next generationof playground martyrs
(Steve Jansen, Slope, 2007)

quinta-feira, novembro 01, 2007

educação e igualdade de oportunidades (I)

Os que têm vindo a defender, desde há uns anos a esta parte, a elaboração dos rankings de escolas do ensino secundário, não previram certamente algumas das ilacções que hoje se podem extrair com uma consistência cada vez maior deste exercício, e que precisamente decorrem da discussão que os próprios rankings vieram permitir.
Aquela que é porventura uma das conclusões mais evidentes, e que apenas terá surpreendido os adeptos indefectíveis deste processo, reside na constatação (cada vez mais demonstrada) de que o ranking é muito mais a revelação de uma fotografia dos contextos territoriais, sociais, económicos e culturais em que cada estabelecimento de ensino se insere, e muito menos um retrato do trabalho desenvolvido por cada escola.
De facto, quem julgou que este mecanismo possibilitaria uma avaliação fidedigna das escolas e do seu desempenho (por se centrar nos resultados dos exames, e portanto no "final do processo"), pode assumir o desengano com crescente fundamento. O mundo que o ranking ilumina é essencialmente o mundo das realidades sociais, o mundo dos contextos e das condições de vida e de estudo dos alunos. É o mundo das diferenças de background familiar, das distâncias, tempos e formas de mobilidade entre a casa e a escola. É o mundo dos rendimentos diferenciados das famílias e do distinto acesso a recursos de conhecimento, entre outros factores.
Os rankings avaliam muito mais o meio social do que a escola, sendo essa a sua verdadeira utilidade, ao colocarem em relevo a questão pública que realmente importa: em que medida se cumpre o papel inigualável do sistema educativo na promoção da igualdade de oportunidades?