quarta-feira, janeiro 30, 2008

sketch fácil

Alguém exige insistentemente a Sócrates que proceda à remodelação governamental, pedido que este ignora olimpicamente, assobiando para o ar.
Exaustão na insistência do pedido. Uma breve pausa e, como se nada se tivesse passado, diz subitamente o primeiro-ministro: "Hum, tive uma ideia. Acho que vou fazer uma remodelação".

quinta-feira, janeiro 24, 2008

viagem à cidade submersa

Se Menezes consegue ou não desmantelar o Estado em 6 meses não sabemos. Mas tendo essa oportunidade, bem pode seguir as pisadas de Carlos Encarnação, presidente da Câmara Municipal de Coimbra.
Em quatro anos (2004-08), o orçamento municipal para a cultura passou de 13 milhões para menos de 2 milhões de Euros (como ilustra o gráfico, encontrado aqui). Ou seja, uma redução superior a 80%, que na moeda antiga significa encolher um envelope de 2,6 milhões de contos/ano à magreza de cerca de 400 mil contos/ano). Mas a questão financeira é apenas o sinal mais óbvio de uma estratégia deliberada de asfixia e destruição, rumo a uma cidade submersa, fantasma e invisível.
A política seguida em Coimbra nos últimos quatro anos assenta no desprezo total pelas mais criativas e promissoras iniciativas culturais (de que são eloquentes exemplos a Escola da Noite e o Centro de Artes Visuais, entre outros). Na perseguição e enfrentamento arrogante de todas as formas de cultura capazes de colocar uma cidade no mapa, de configurar e projectar a sua vida, diversidade e identidade, de tirar partido do seu potencial (sabendo como sabemos que a cultura é hoje um dos factores decisivos para a afirmação das cidades contemporâneas).
No manto do desconhecimento mediático a que apenas Lisboa e Porto escapam, vale a pena fazer uma viagem de descoberta e perplexidade, começando por conhecer o perfil e pensamento do inenarrável vereador Mário Nunes. Siga-se então por aqui, uma das portas de acesso às diversas fontes e factos que permitem compreender como - ao longo de quatro anos - a cultura em Coimbra chegou ao estado a que chegou (e onde se pode subscrever o Manifesto "Pelo direito à cultura e pelo dever de cultura!").
A esta agressão descarada e humilhante, desprovida de quaisquer escrúpulos e ética, alguns meios e agentes culturais têm resistido estoicamente, no limiar das suas forças. E é por isso chegado o momento de toda a cidade se erguer, repudiando a política da sua edilidade, que para todos os efeitos a representa. De pura e simplesmente não querer ser cúmplice da submersão. De dizer basta. De dizer: nunca em nosso nome.

domingo, janeiro 20, 2008

nocturno olhar

Pedido de empréstimo à colecção Outono-Inverno/2007 de Miss Allen. Um provável vislumbre do Jardim da Manga, a exalar o cair da humidade com a noite, na improvável cidade de Coimbra.

quarta-feira, janeiro 16, 2008

razões sem razão

"Para se fazer perdoar em certa ocasião pela namorada Ophelia, escreveu assim Fernando Pessoa: eu sei que não tenho desculpa; mas tenho desculpas. Para nos justificar por que razão não convoca o referendo sobre o Tratado de Lisboa, José Sócrates está numa posição semelhante. Tem muitas razões. Mas não tem razão.
(...) Sócrates pode dizer: mas Sarkozy, mas Merkel, mas Gordon Brown. Mas nada. O compromisso que ele tinha não era com Sarkozy, nem com Merkel, nem com Gordon Brown. Nem sequer com Cavaco Silva. Esse compromisso era conosco.
Sócrates pode dizer: tomaria algum de vocês uma decisão diferente, colocando em risco a União Europeia? E a resposta é: talvez não. Mas se assim é, teria feito melhor em dizer-nos desde o início que o referendo era impossível de se fazer."

(Do artigo de Rui Tavares, a 10 de Janeiro)

sexta-feira, janeiro 11, 2008

songs for the season

Another day is over (The Durutti Column, 1989)

terça-feira, janeiro 08, 2008

populações

No anúncio do "Prós e Contras" desta semana (encerramento das urgências), prometeu-se literalmente "a presença do ministro Correia de Campos, de autarcas, médicos e populações".
Sim, populações. Ao vivo e em directo. Populações em estado natural e arrumadas. Observáveis a olho nu com a nitidez de um eclispe da lua, num momento tão improvável de contemplação de fenómenos como fotografar um gambuzino a sair da toca, ou assistir duas vezes durante a vida à passagem do cometa Halley.
Mas as populações estiveram agitadas. E Fátima Campos Ferreira teve que lhes lembrar o compromisso do "senta, senta, dá a pata", obtido antes do início da emissão a troco de estarem ali e aparecerem nos pequenos ecrans, lá em casa.

segunda-feira, janeiro 07, 2008

passos perdidos

Nunca supôs que o futuro viesse a dar tanta materialidade ao nome das coisas.

sexta-feira, janeiro 04, 2008

fuligem

"Agora não pode fumar lá dentro", dissera-lhe, como quem devolve o troco, a senhora do quiosque que ficava a cem metros do local de trabalho, no momento em que lhe servia o sg ventil.
Para além do sarcasmo miudinho, era o gozo indisfarçável da pequena ameaça, da possibilidade de denúncia que a lei lhe tinha colocado nas mãos desde o dia um. Como se, não podendo entrar no local de trabalho para o apanhar com a boca na botija, fosse suficiente, para efeitos criminais, a circunstância de ele lhe ter pedido um maço de cigarros a troco de dinheiro.
"Faz mal à saúde... É para seu bem", anuiu a zelosa senhora, no momento em que tudo à sua volta ficou subitamente a preto e branco, no ar a fuligem saída de um livro de Orwell e um recúo de mais de trinta anos no tempo.
"Ah, já me esquecia... Queria também uma licença de porte de isqueiro, se faz favor...".