cidade sem estátuas (XI)

Uns aparecem, outros desaparecem. Nesta representação das aparições de Fátima, em plena cidade da Horta (Ilha do Faial), um dos pastorinhos (mais concretamente Lúcia, que pediu para não ser identificada), decidiu basar no momento em que Nossa Senhora se preparava para dirigir a palavra aos videntes. Procurando justificar a ausência da prima, Jacinta e Franscisco disseram à Senhora que Lúcia tinha ido comprar uns óculos de massa. Contudo, residentes no local afirmaram ter visto a pastorinha deslocar-se em direcção à praia com um equipamento de mergulho e caça submarina. Para a Senhora, a mudança de ramo de actividade não constitui motivo de reprimenda: "Rebanhos ou cardumes valem o mesmo aos olhos de Deus, mesmo que o peixe esteja mais barato que o gado caprino. Para o Criador, o importante é assegurar o controlo das massas", disse. O que realmente arreliou a Senhora foi o facto de Lúcia não ter tido o cuidado de deixar um simples bilhete a dizer "Volto já".

regressos solidários

Vale mesmo a pena ler os dois textos mais recentes do Pedro (um sobre a questão dos apoios do Estado ao desporto, o outro sobre a percepção da situação política e social em Angola), que marcam o já há muito esperado regresso do Individualismo Solidário, com um novo rosto.

o mar, as flores e as vacas

Ilhas de São Jorge e Pico (Açores, 2008)

navegação à vista

Cavaco Silva, quando interprelado pela comunicação social, na sequência de uma qualquer declaração que decide dirigir ao país, faz-me sempre lembrar um barco. Enquanto está atracado ao porto (na segurança do discurso previamente preparado) tudo corre bem. Mas quando surgem as perguntas inesperadas dos jornalistas dá início a uma espécie de navegação à vista. É algo como tatear no escuro à procura das palavras e das respostas, sem saber bem até onde pode ou quer ir. Sem saber muito bem, para além da mensagem previamente estudada, o que quer acrescentar (um bom exemplo disto mesmo surgiu há momentos, na edição da noite da SIC Notícias, na sequência da intervenção presidencial sobre a necessidade de actuação do governo face aos recentes casos de criminalidade). Há pormenores, por vezes, que dizem imenso sobre as pessoas.

cidades com estátuas (X)

Pescador de baleias (São Roque, Ilha do Pico, 2008)

para além das nuvens

Montanha do Pico (2.351 metros de altitude). A subida a pé inicia-se aos 1.200 metros, num percurso íngreme e incerto, que permite sentir a descida gradual da temperatura, o desaparecimento progressivo da vegetação (que no topo quase se resume a algumas espécies de musgo e escassos arbustos, cada vez mais rasteiros) e a imposição progressiva do silêncio.

Ao atravessar o banco de nuvens percebe-se como as condições climatéricas são apenas uma espécie de estado de alma do tempo, tão impressivo no seus cinzentos como nas suas luminosidades.

"There is always sunshine, above the grey sky" (David Sylvian).
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lunar

Foi há 50 anos, mas pela paisagem dir-se-ia ter sido ontem. Do solo desprendem-se ainda facilmente poeiras e cinzas vulcânicas, deixando fragmentos de lava e basalto a pontuar de onde em onde a planície escurecida e árida. O Vulcão dos Capelinhos, que começou por ser um vulcão submarino (ampliando na fase terrestre o extremo poente da Ilha do Faial), dá a noção clara da duração do tempo geológico, perante a qual todos os tempos são efémeros.
(Mais fotografias aqui)

mundos inferiores

"Nacionalmente, os resultados dos jogos olímpicos foram maus. Estão ao nível de países dos mundos inferiores, onde não há sequer Estado para pedir responsabilidades." (Mário Crespo, na revista Única).
Como diz o Irmão Lúcia, "os créditos de simpatia granjeados pelo crespo na mítica entrevista ao major valentim loureiro estão mais do que esgotados."

oposição e poder

"As pessoas podem respeitar um partido por estar na oposição; as pessoas podem respeitar um partido por estar no poder. Podem respeitar um partido que está no poder numa cidade e na oposição no país - que dificuldade há em entender isso? Mas nunca respeitarão um partido que está no poder como se estivesse na oposição."

(Do artigo de Rui Tavares, no Público de 7 de Agosto)

songs for the season

Incantations (Mike Oldfield, Exposed, 1978), na falta do tema "Agricultura de subsistência nos Açores", de João Paulo Adaixo (apenas disponível em cassete, caso o único exemplar da mesma tenha sobrevivido às malhas fortuitas do tempo).

a passadeira sumida

"A mensagem subliminar da passadeira sumida é que, de facto, o seu papel não é muito importante, que a regra que ela pretensamente impõe não é respeitável, que ela não é levada a sério por ninguém e que ninguém se importará muito se ela não for respeitada. Uma sociedade democrática rege-se por normas consensualmente impostas para benefício de todos, mas para isso é fundamental que o princípio da equidade seja respeitado. Eu só respeitarei uma regra se ela for respeitada por todos, só pararei na passadeira se todos pararem, só pagarei impostos se eles forem pagos por todos, etc. A passadeira sumida declara que quem a pintou não acata a disciplina que exige de mim ou, alternativamente, declara que, na realidade, não exige disciplina de ninguém."

(Do artigo de José Vítor Malheiros, no Público de 12 de Agosto)

país imaculado

"Neste país onde os bancos 'arredondaram' os empréstimos à habitação e meteram ao bolso uma média de cinco mil euros por família, os ciganos são ladrões. Neste país onde a Operação Furacão encontrou fraude empresarial de grande escala mas não chegará a lado nenhum, os ciganos é que são os dissimulados. Neste país onde Paulo Portas ainda não explicou quem é o famoso Jacinto Leite Capelo Rego que generosamente deu dinheiro ao seu partido (nem explicou o 'caso sobreiros', nem o 'caso submarinos', nem o 'caso casino'), os ciganos é que são os malandros."

(Do artigo de Rui Tavares, no Público de 4 de Agosto)

uma história da música (I)

Architecture & Morality (Orchestral Manoeuvres In The Dark, 1982)

the meaning of august

"O Público noticia hoje que «qualquer gesto que possa ser interpretado como uma "situação mais íntima" nas praias algarvias está proibido, por ordem do Comando Marítimo do Sul». Tranquiliza saber que as autoridades vigiam os costumes pátrios. Não há libido estival que uma valente coima não acalme. O motivo imediato deste zelo policial é a propagação das «massagens», esse nefasto costume tailandês. O comandante do CMS explicou o perigo das ditas: «toda a gente sabe como começam mas ninguém sabe como acabam». Dirão que o homem é um primitivo. Eu acho que ele é um Rochefoucauld. Garanto que não conheço melhor definição de Agosto: sabemos como começa mas ninguém sabe como é que acaba."

(Do Estado Civil, acerca da notícia de um comandante que sabe como começam as massagens, mas que guarda para si a informação sobre como começa a parvoice).