Uma decisão conjunta da Comissão Europeia e do Parlamento Europeu estabeleceu 2010 como o
Ano Europeu de Luta contra a Pobreza e a Exclusão Social. Exacto, 2010, um ano em grande para a agenda política das soluções recessivas à escala europeia. O ano do Cavalo de Tróia, em que o imperativo de combate ao défice nos países periféricos estabeleceu escru-pulosamente as regras da batalha: cortar nas despesas sociais e nos salários, deixando a salvo os interesses financeiros, a economia especula-tiva, a espiral do endividamento privado e a injustiça fiscal.
Seguindo as orientações da própria iniciativa comunitária, tratou-se essencial-mente de "
responsabilizar e mobilizar o conjunto da sociedade", descentrando das instâncias estatais a responsabilidade colectiva no combate à exclusão social. Nada de contraditório, portanto, com o rumo austeritarista definido: conter o défice cerceando as funções sociais do Estado, sacrificando as classes com menores recursos e transmutando a lógica de direitos estabelecidos numa difusa e incerta responsabilidade da sociedade no seu todo, sem explicitamente confi-gurar, atribuir ou firmar qualquer espécie de compromisso.
Vale a pena espreitar o conjunto de
iniciativas que preencheram, entre nós, a "celebração" do Ano Europeu de combate à Pobreza e Exclusão Social (AECPES) e que consumiram, aparentemente de modo exaustivo, os cerca de
700 mil euros orçamentados. São essencialmente conferências, debates, mostras e colóquios. Que envolveram sobretudo pessoas e instituições conhecedoras dos contornos da pobreza e da exclusão.
Parole, parole, parole. À perplexidade que fomos sentindo ao ver os spots publicitários, a intercalar as notícias sobre os PECs e os cortes sociais, junta-se este confrangedor balanço (sobretudo no confronto com que um ano assim
deveria significar). Na página portuguesa do AECPES
figura a tshirt aqui ao lado. Não, não precisam fazer um desenho, já percebemos tudo.
(Postado originalmente no
Ladrões de Bicicletas)