sexta-feira, novembro 24, 2006

fall again

(The Durutti Column, Amigos em Portugal, 1983)
"Música há como lugares de habitação e dormida. Música há como se trouxesse dentro arquitectura. As músicas modernas assemelham-se a certos edifícios. Mas a música dos Durutti Column é, e só pode ser isto, um pequeno mosteiro medieval. Mesmo ao centro, para quem entrar nele livremente, está a melodia, que é o jardim dos claustros. A paz e o sossego que a pedra protege é de paisagem sempre diferente. É uma música tranquila, resguardada e impossivelmente linda. A guitarra de Reilly fecha-se em ideias interiores de suaves melodias, e constrói paisagens de cartão-postal.
A música nunca foi tantas paisagens. Quadros platónicos e bucólicos, vastos jardins verdes, ininterruptos por excessos climatéricos. A guitarra vai pintando-os. Aqui o prado cheio de póneis brancos, ali uma pequena sebe de amoreiras, e além apenas os traços mais suaves do azul-cinzento do céu.Eis a natureza (estonteante acalmia) e eis os homens (terrível prepotência). Porque esta música não é uma coisa prosaica e ingénua. Aqui também há luta. O que é preciso é raspar levemente a superfície da pintura, para encontrar a sua base de tintas negras e feias, o seu medonho inconsciente. Não há beleza sem contraponto, nem harmonia sem contraste.
"
(Excertos 'livres' de: "Durutti Column: dum mosteiro e da sua música, tão bela como o silêncio", in: Miguel Esteves Cardoso, Escrítica Pop, 1983)