quinta-feira, novembro 04, 2010

ensaio sobre a desfaçatez

Num debate ontem realizado na Univer-sidade Católica, Daniel Bessa admite poderem “ser precisos outros PEC”, uma vez que Portugal vai “entrar num período profundo de recessão, durante muitos anos”. Isto é, um dos grandes arautos das políticas recessivas (cortes salariais, privatização dos serviços públicos e redução da receita proveniente do IRC, entre outras), considera que a cura para a recessão é somar-lhe mais recessão, através do reforço de medidas que estiolam ainda mais o consumo.
No silêncio da argumentação ficam quaisquer referências ao papel da dinâmica especulativa dos mercados na situação actual, aos impactos da crise financeira nos orçamentos públicos, ou um apontamento que fosse sobre as disfuncio-nalidades assumidas do actual modelo de governação económica europeia.
A desfaçatez deste economista do regime, que não se detém um segundo que seja na análise da coerência e sustentação do que defende, faz lembrar aquele notável momento de Marcelo Rebelo de Sousa por ocasião do referendo sobre a despenalização do aborto. "Os PEC têm em vista a saída da crise?", "Sim" - "Podemos então esperar que eles invertam a recessão?", "Não" - "Mas se necessário deverão ser adoptados novos PEC...", "Sim" - "Não vê problema em que eles agravem a situação...", "Não".

(Postado originalmente no Ladrões de Bicicletas)