compromisso moral (2)
(Do artigo de André Freire, no Público de 21 de Agosto)
“Às enormes diferenças de poderio militar que estão na base da gigantesca desproporção de vítimas e de destruição chamam os especialistas militares “guerra assimétrica". (…) Apesar da desproporção referida quanto aos efeitos da guerra, há um relativo consenso que Israel perdeu a guerra e o Hezbollah ganhou-a. O primeiro porque não conseguiu eliminar o segundo, nem sequer esmagá-lo, como pretendia. O Hezbollah terá vencido porque, além de ter aterrorizado as populações do Norte de Israel, conseguiu resistir sem ser destruído face a um dos mais forte exércitos do mundo.
(…) Mas há, na minha perspectiva, outras consequências desta guerra, mais de índole psicológica e cultural, mas nem por isso menos relevantes. Israel arvorou sempre a bandeira da superioridade moral face ao Hezbollah: a sua “guerra” era diferente da perpetrada pela milícia xiita, porque o Estado Judaico só procurava atingir alvos militares, enquanto que o adversário procurava primordialmente atingir alvos civis. Além disso, a milícia libanesa escudava-se entre a população civil e usava instalações civis para lançar os seus rockets. Porém, por um lado, independentemente dos julgamentos éticos, há que reconhecer que se o Hezbollah se escudava entre a população civil era porque de uma forma ou de outra tinha o seu beneplácito. Por outro lado, no contexto desta “guerra assimétrica”, não se percebe como poderia a milícia xiita deixar de usar de todos os meios ao seu alcance para resistir e atacar.
Mas perante as evidências da brutal destruição do Líbano perpetrada por Israel, bem como perante os massacres de civis (incluindo muitas crianças), como em Cana, ou perante a morte dos quatro funcionários da ONU, ou ainda face aos milhares de libaneses obrigados a fugir de suas casas, tornou-se cada vez mais difícil a Israel tornar verosímil a tese da superioridade moral da “sua guerra”. O exercício de hipocrisia e cinismo foi ao ponto de se considerarem irresponsáveis pelos mortos e feridos entre as populações civis apenas e só porque estas eram previamente avisadas para deixarem as suas casas. Não, esta “guerra suja” (…) foi pelo menos tão suja da parte israelita como o terá sido da parte xiita. E também por isso Israel perdeu esta guerra, desde logo perante as opiniões públicas (árabes e ocidentais).
Num cartoon intitulado A Crescente Ameaça, a revista The Economist apresentava um guerrilheiro do Hezbollah reduzido a pó por um tanque israelita. Porém, nas cenas seguintes, a partir das cinzas surgiam vários guerrilheiros em vez de um. Podemos ver aqui quer uma ilustração da subestimação da capacidade do Hezbollah, quer uma metáfora dos efeitos perversos desta guerra. Ou seja, tal como a “guerra ao terrorismo” da administração Bush, a estratégia musculada de Israel parece também ter o efeito perverso de alimentar a fúria e o radicalismo islâmico que diz pretender combater.”
“Às enormes diferenças de poderio militar que estão na base da gigantesca desproporção de vítimas e de destruição chamam os especialistas militares “guerra assimétrica". (…) Apesar da desproporção referida quanto aos efeitos da guerra, há um relativo consenso que Israel perdeu a guerra e o Hezbollah ganhou-a. O primeiro porque não conseguiu eliminar o segundo, nem sequer esmagá-lo, como pretendia. O Hezbollah terá vencido porque, além de ter aterrorizado as populações do Norte de Israel, conseguiu resistir sem ser destruído face a um dos mais forte exércitos do mundo.
(…) Mas há, na minha perspectiva, outras consequências desta guerra, mais de índole psicológica e cultural, mas nem por isso menos relevantes. Israel arvorou sempre a bandeira da superioridade moral face ao Hezbollah: a sua “guerra” era diferente da perpetrada pela milícia xiita, porque o Estado Judaico só procurava atingir alvos militares, enquanto que o adversário procurava primordialmente atingir alvos civis. Além disso, a milícia libanesa escudava-se entre a população civil e usava instalações civis para lançar os seus rockets. Porém, por um lado, independentemente dos julgamentos éticos, há que reconhecer que se o Hezbollah se escudava entre a população civil era porque de uma forma ou de outra tinha o seu beneplácito. Por outro lado, no contexto desta “guerra assimétrica”, não se percebe como poderia a milícia xiita deixar de usar de todos os meios ao seu alcance para resistir e atacar.
Mas perante as evidências da brutal destruição do Líbano perpetrada por Israel, bem como perante os massacres de civis (incluindo muitas crianças), como em Cana, ou perante a morte dos quatro funcionários da ONU, ou ainda face aos milhares de libaneses obrigados a fugir de suas casas, tornou-se cada vez mais difícil a Israel tornar verosímil a tese da superioridade moral da “sua guerra”. O exercício de hipocrisia e cinismo foi ao ponto de se considerarem irresponsáveis pelos mortos e feridos entre as populações civis apenas e só porque estas eram previamente avisadas para deixarem as suas casas. Não, esta “guerra suja” (…) foi pelo menos tão suja da parte israelita como o terá sido da parte xiita. E também por isso Israel perdeu esta guerra, desde logo perante as opiniões públicas (árabes e ocidentais).
Num cartoon intitulado A Crescente Ameaça, a revista The Economist apresentava um guerrilheiro do Hezbollah reduzido a pó por um tanque israelita. Porém, nas cenas seguintes, a partir das cinzas surgiam vários guerrilheiros em vez de um. Podemos ver aqui quer uma ilustração da subestimação da capacidade do Hezbollah, quer uma metáfora dos efeitos perversos desta guerra. Ou seja, tal como a “guerra ao terrorismo” da administração Bush, a estratégia musculada de Israel parece também ter o efeito perverso de alimentar a fúria e o radicalismo islâmico que diz pretender combater.”
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